Os Museus Vaticanos não são apenas uma das maiores coleções de arte do mundo — são uma verdadeira viagem pela história da humanidade, da Antiguidade ao Renascimento. Com mais de 70 mil obras em seu acervo e cerca de 7 quilômetros de galerias e salas, esse complexo monumental atrai milhões de visitantes todos os anos, encantados com sua beleza, grandiosidade e importância histórica.
Entre esculturas imponentes, afrescos que parecem vivos, tapeçarias riquíssimas e pinturas que marcaram a cultura ocidental, cada sala revela tesouros que merecem ser vistos de perto. E em meio a tanta grandiosidade, há obras que simplesmente não podem passar despercebidas. Por isso, reunimos neste artigo uma seleção das obras mais impactantes e simbólicas dos Museus Vaticanos — aquelas que devem ser apreciadas por quem tem o privilégio de estar por ali. Confira!
Capela Sistina – Museus Vaticanos
A Capela Sistina é um verdadeiro ícone da arte e da fé, um espaço onde o divino e o humano se encontram através da genialidade de Michelangelo. Reconhecida mundialmente tanto pelo seu papel sagrado nas eleições papais quanto pelos seus afrescos extraordinários, a Capela é um dos maiores tesouros do Vaticano e um marco inesquecível da história da arte ocidental.
Os afrescos do teto foram encomendados pelo Papa Júlio II a um Michelangelo inicialmente relutante — o artista, perfeccionista e autocrítico, duvidava de suas habilidades como pintor. Ainda assim, aceitou o desafio e, em cerca de quatro anos, criou uma obra monumental que, nas palavras do poeta Goethe, é impossível de imaginar sem vê-la: uma expressão única do que um homem sozinho pode alcançar. Trabalhando no alto do teto, em condições físicas e técnicas muito difíceis, Michelangelo produziu detalhes de uma perfeição impressionante, que encantam e emocionam quem tem a chance de contemplá-los pessoalmente.
O símbolo mais famoso dessa obra-prima é a cena da Criação do Mundo, onde Michelangelo captura em um simples, mas poderoso gesto, o mistério da Gênesis: o toque divino que confere vida ao homem, feito à imagem e semelhança de Deus, e dotado do poder de criar grandiosamente, assim como seu Criador.

O afresco que cobre a parede atrás do altar da Capela Sistina foi realizado por Michelangelo já na fase final de sua vida, sob encomenda do Papa Paulo III. Trata-se de uma das obras mais impactantes do Renascimento: o Juízo Final.
Com intensidade dramática e profunda carga emotiva, Michelangelo retrata o momento supremo da condenação e da salvação. No centro da composição, a figura de Cristo domina a cena com um gesto enérgico, que parece pôr em movimento todos os personagens ao seu redor.
De um lado, o desespero das almas condenadas que são arrastadas ao Inferno; do outro, a serenidade das almas salvas que ascendem à glória celeste. A tensão entre essas forças opostas percorre toda a obra, tornando-a viva e quase palpável.

Como marca pessoal, Michelangelo deixou ali também seu autorretrato: o rosto do artista aparece na pele esfolada segurada por São Bartolomeu — uma imagem ao mesmo tempo simbólica e profundamente humana.

Escola de Atenas – Raffaello – Museus Vaticanos
Uma das imagens mais icônicas do mundo e, sem dúvida, um dos maiores símbolos do Renascimento, A Escola de Atenas é uma obra-prima incomparável criada por Raffaello Sanzio — e ele tinha apenas 20 anos quando a pintou! A pedido do Papa Júlio II, Rafael decorou as paredes da Stanza della Segnatura, uma das salas dos escritórios papais no Vaticano, com afrescos que hoje são considerados entre as maiores obras-primas da arte italiana.
Neste afresco monumental, Rafael compôs uma verdadeira enciclopédia visual dos maiores pensadores da Antiguidade: de Pitágoras a Sócrates, de Arquimedes a Heráclito, reunindo os matemáticos, filósofos e sábios que moldaram o pensamento ocidental. No centro da composição, duas figuras se destacam: Platão, que aponta para o céu, simbolizando o mundo das ideias, e Aristóteles, que direciona o olhar para a terra, representando o mundo físico. Esses dois gigantes da filosofia foram a inspiração para os homens do Renascimento — e a presença deles neste espaço sagrado é uma celebração da busca pelo conhecimento.

Laocoonte – Museus Vaticanos
A impressionante escultura de Laocoonte é uma das descobertas mais fascinantes do Renascimento, resgatada durante escavações em Roma que chegaram a ser observadas por ninguém menos que Michelangelo.
Essa obra monumental — com quase dois metros e meio de altura — retrata um momento dramático da guerra de Tróia: o sacerdote Laocoonte e seus filhos lutando desesperadamente contra as serpentes enviadas pelos deuses, punição divina por sua tentativa de alertar os troianos sobre o famoso Cavalo de Troia.
A força e a técnica dessa escultura são incríveis — é possível quase sentir o sofrimento, o esforço e a agonia nas expressões e nos corpos tensionados dos personagens. Localizada na seção de arte antiga dos Museus Vaticanos, Laocoonte é uma dessas obras que prendem o olhar e a alma — uma verdadeira experiência que só quem estiver ali poderá vivenciar.

Apolo do Belvedere
Considerada por muitos como uma das mais belas esculturas da Antiguidade — e até mesmo de todos os tempos —, esta obra representa o ideal de beleza para os Gregos, refletindo perfeição e harmonia em cada detalhe.
Trata-se do Apolo do Belvedere, deus da poesia e dos oráculos, retratado no momento triunfante de sua vitória sobre a serpente Píton. Além da imponência da pose majestosa e elegante, impressiona a delicadeza com que o manto esculpido parece tecido real, desafiando a dureza do mármore.
Datada do século II d.C., a escultura foi redescoberta no Renascimento e, por sua importância, chegou a ser levada para a França por Napoleão quando este se tornou rei da Itália. Após sua derrota, a obra retornou ao Vaticano, onde hoje pode ser admirada em meio a outras preciosidades da arte grega.

Deposição de Cristo – Caravaggio
Outra obra-prima inestimável dos Museus Vaticanos é esta pintura de Caravaggio, considerada uma das mais significativas de sua carreira. A obra retrata o momento profundamente comovente da deposição de Jesus: o apóstolo João, imerso em tristeza, sustenta o corpo de Cristo, apoiado por Nicodemos; atrás deles, três figuras femininas capturam a dor em suas formas mais puras — Maria Madalena, com os olhos fechados, enxugando as lágrimas; Maria, mãe de Jesus, com um olhar sereno e fixo no filho; e Maria de Cléofas, tia de Jesus, erguendo os braços aos céus em desespero.
O estilo único de Caravaggio, que humaniza os personagens sagrados, retratando-os com uma naturalidade sem idealizações, faz com que a cena pareça acontecer aqui e agora. Essa proximidade torna o momento da deposição incrivelmente realista — e ainda mais doloroso e tocante para quem o contempla.

Galeria dos Mapas Geográficos
A Galeria dos Mapas é uma verdadeira viagem pela Itália renascentista, onde arte e ciência se encontram em uma celebração única da geografia e do talento humano. A impressionante galeria é uma das maiores e mais fascinantes do seu gênero, com cerca de 120 metros de extensão, decorada com mapas pintados que retratam as diversas regiões do território italiano da época.
Encomendados pelo Papa Gregório XIII no final do século XVI, esses mapas são verdadeiras obras-primas, onde precisão cartográfica e maestria artística se unem para criar um painel histórico e cultural incomparável. Cada mapa revela não apenas a geografia, mas também a riqueza cultural e religiosa das regiões, retratadas com detalhes impressionantes e cores vibrantes que ainda hoje encantam os visitantes.
Ao caminhar pela Galeria dos Mapas, é possível sentir a grandiosidade do projeto que combinou conhecimento, fé e arte, transportando o observador a uma época em que o mundo começava a ser desvendado de novas formas. É uma experiência que vai muito além da simples apreciação visual — é um convite a refletir sobre a história, a expansão do conhecimento e a beleza do legado cultural italiano.

São Jerônimo de Leonardo da Vinci
Poucas obras nos Museus Vaticanos conseguem comover tanto quanto o inacabado — e ainda assim magistral — “São Jerônimo” de Leonardo da Vinci. Em meio a tantas criações completas e grandiosas, essa pintura chama a atenção justamente pelo que não está finalizado, revelando o processo criativo e a alma inquieta de um dos maiores gênios da história da arte.
A obra retrata São Jerônimo, uma das figuras mais importantes da Igreja, profundamente concentrado em sua penitência no deserto. Sua expressão é intensa, marcada por dor, fé e reflexão. O corpo magro e castigado, quase esculpido em luz e sombra, revela o profundo conhecimento anatômico de Leonardo, e seu domínio incomparável da emoção humana. Aos pés do santo, um leão — seu companheiro fiel, símbolo da sua história e da sua força espiritual — completa a cena.
A pintura permaneceu desaparecida por séculos, desmembrada em partes e esquecida, até ser redescoberta e restaurada no século XIX. Hoje, seu estado incompleto a torna ainda mais fascinante: nela, vemos não apenas o santo, mas também o artista — suas dúvidas, suas escolhas, sua genialidade em construção.
É uma daquelas obras que nos fazem parar e contemplar em silêncio, como se Leonardo, mesmo séculos depois, ainda nos tocasse com a ponta do pincel.

O Torso do Belvedere
O Torso do Belvedere é uma das esculturas mais enigmáticas e reverenciadas dos Museus Vaticanos — uma obra que fascina artistas e estudiosos há séculos, mesmo em seu estado fragmentário. Esculpido em mármore branco e atribuído ao artista ateniense Apolônio, o torso é datado do século I a.C. e representa um exemplo notável da corrente neoática, que se inspirava em modelos clássicos da Grécia do século II a.C.
Conhecido em Roma desde o século XV, o Torso foi incorporado às coleções do Vaticano entre 1530 e 1536. Desde então, tornou-se um verdadeiro ícone para os mestres do Renascimento, entre eles Michelangelo, que o admirava profundamente e chegou a dizer que jamais ousaria “recompor” a escultura, tamanha a sua perfeição na forma atual.
Embora faltem cabeça, braços e pernas, estudiosos acreditam que a obra represente o herói grego Ájax Telamônio, no momento dramático em que medita o suicídio. Segundo a tradição, Ájax, tomado pela loucura após Ulisses ser escolhido para herdar as armas de Aquiles, decide tirar a própria vida. A reconstrução iconográfica sugere que a cabeça do herói estaria apoiada na mão direita, que por sua vez seguraria a espada — elemento chave para compreender a tensão e o drama interior captados na escultura.
Outros estudiosos sugerem que Ajax estaria curvado para frente, com a mão esquerda na cabeça e a direita prestes a se lançar sobre a espada fincada no chão.
O que impressiona no Torso não é apenas sua anatomia vigorosa e realista, mas a densidade emocional que emana da obra: uma expressão de dor contida, de força interior prestes a se romper. Diante dele, entende-se por que os grandes artistas o viam como uma lição eterna de forma, emoção e humanidade esculpida no mármore.

A Escada helicoidal de Giuseppe Momo
Entre tantas obras que surpreendem pela grandiosidade ou pela delicadeza dos detalhes, há também aquelas que encantam pela engenhosidade arquitetônica. É o caso da escada helicoidal que encerra o percurso pelos Museus Vaticanos — uma das últimas visões do visitante, mas certamente uma das mais marcantes. Ícone absoluto de simetria, funcionalidade e elegância, essa estrutura criada em 1932 é uma despedida à altura do esplendor que se acaba de testemunhar.
Projetada por Giuseppe Momo (1875–1940), arquiteto piemontês de grande destaque, a escada foi construída como parte de uma ampla reestruturação urbana do Vaticano. Essa transformação foi encomendada pelo papa Pio XI — conhecido como o Papa Construtor — logo após a assinatura do Tratado de Latrão, que oficializou a criação do Estado do Vaticano em 1929.
Entre as diversas obras projetadas por Momo para essa nova “cidade dentro da cidade”, destacam-se a estação ferroviária vaticana, o Portão de Sant’Anna, o Palácio do Tribunal, a sede dos Correios, o Palácio das Congregações, a Pontifícia Universidade Lateranense e, claro, a nova entrada monumental dos Museus Vaticanos. Mas foi com sua escada helicoidal que o arquiteto conquistou um lugar permanente na história da arquitetura.
A genialidade do projeto está no conceito: duas rampas em espiral, entrelaçadas mas independentes — uma ascendente, outra descendente — permitem o fluxo contínuo de visitantes sem que eles se cruzem. A estrutura lembra uma concha ou até uma dupla hélice de DNA. Foi tão inovadora para sua época que inspirou outros grandes arquitetos, como Frank Lloyd Wright, na criação da célebre escada do Museu Guggenheim, em Nova York.
Hoje, essa escada hipnotizante é utilizada apenas na descida, como a última etapa do percurso pelos Museus. Ao caminhar por ela, envolto pela luz natural que penetra pela claraboia central e pelos detalhes refinados da balaustrada em ferro fundido, o visitante encerra sua jornada com a mesma sensação de encanto e admiração com que começou.

Estátua do Nilo – Museus Vaticanos
A estátua do Nilo, localizada no Museu Pio-Clementino, é uma grandiosa representação alegórica do rio que foi centro da civilização egípcia. Esta escultura em mármore é de origem greco-romana, provavelmente do século I ou II d.C., e revela a fascinação dos Romanos pela cultura do Egito. Ela foi descoberta em Roma, no Campo Marzio, onde havia um templo dedicado a Ísis, e mais tarde foi levada ao Vaticano. Hoje está instalada em uma exedra (nicho semicircular) majestosa, rodeada por outras esculturas egípcias.
A figura central é a personificação masculina do Rio Nilo, retratado como um homem deitado, de porte robusto, com barba longa e expressão serena, em alusão à fertilidade e abundância trazidas pelas enchentes do rio. Ele repousa apoiado em uma esfinge e segura um córnucopia, o símbolo clássico da fartura.
Ao redor do corpo do deus-fluvial, há uma multidão de pequenas figuras infantis (putti) que brincam, escalam e interagem com ele e com os objetos ao redor — uma alusão aos 16 cúbitos (unidade de medida) da cheia ideal do Nilo: há 16 crianças representadas, uma para cada cúbito.
Além disso, a escultura está repleta de detalhes simbólicos: animais do Egito como crocodilos, hipopótamos e cobra; plantas do delta do Nilo, como papiros; objetos egípcios, como vasos e elementos arquitetônicos.
Essa composição exuberante é um verdadeiro manifesto visual da riqueza natural e agrícola do Egito, exaltando o papel do rio como fonte de vida.

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Foto de capa: Isogood / 123rf