Conheça a história de Pienza, a cidade ideal de Pio II

O Renascimento foi uma das épocas de ouro da Itália, um tempo de grandes ideias e projetos, em todos os âmbitos das ciências e das artes. Em meio às encantadoras colinas do sul da Toscana, se esconde uma das joias daquele período, planejada para ser a cidade ideal segundo os moldes da Renascença.

Conheça a história da cidade utópica de Pienza e do homem que a sonhou: papa Pio II.

Vista da cidade de Pienza ao pôr-do-sol.
Vista da cidade de Pienza ao pôr-do-sol. Foto: Jacek Nowak / 123RF.

As origens de Pio II

Pio II nasceu no pequeno burgo de Corsignano, ao sul de Siena na Toscana, no ano de 1405. Sua família possuía remotas origens nobres, mas tinha então caído na pobreza. Seu pai, homem extremamente culto e amante da Antiguidade, decidiu chamá-lo Enea Silvio, nome do herói troiano protagonista da Eneida de Virgílio, do qual acreditava que sua família fosse descendente. O amor pela Roma antiga transmitido por seu pai acompanharia Enea Silvio por toda a vida.

Toscana, uma das mais belas regiões da Itália, lugar de origem da família Piccolomini de Enea Silvio.
Toscana, uma das mais belas regiões da Itália, lugar de origem da família Piccolomini de Enea Silvio. Foto: Zoomteam / 123RF.

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Aos dezoito anos, ele deixou para trás a pequena cidade natal para se dedicar aos estudos em Siena. Sua família o tinha mandado ali para estudar direito na Universidade, mas Silvio não gostava do curso, e preferiu se dedicar ao estudo das letras clássicas, gregas e latinas. Alguns anos depois, seu pai quis mandá-lo também à prestigiosa Florença: aqui ele pôde se tornar aluno de alguns dos maiores nomes do Renascimento italiano. Enea Silvio tinha então vinte e seis anos.

Piazza del Campo - praça principal de Siena
Piazza del Campo – praça principal de Siena, onde Enea Silvio Piccolomini morou por muitos anos, dedicando-se aos estudos. Foto: Jennifer Barrow / 123RF.

Depois de tantos anos de estudo, o rapaz finalmente podia se orgulhar não só de ter superado seu pai em conhecimento e amor pelos Antigos, mas também por ter se tornado um dos melhores oradores e escritores em latim de toda a Europa. O talento e brilhantismo fizeram dele um dos maiores diplomatas da época, homem de confiança seja do Imperador, seja dos papas. Por este motivo Silvio decidiu iniciar a carreira eclesiástica: escolha que o levaria dentro de alguns anos a se tornar, inesperadamente, ele mesmo papa.

Típica paisagem campesina da Toscana
Típica paisagem campesina da Toscana, cenário onde Enea Silvio passou toda sua infância e adolescência. Foto: Stevanzz / 123RF.

O papado

Momento decisivo nesta direção foi a queda de Constantinopla, em 1453: a conquista do Império Bizantino por parte dos muçulmanos abalou os europeus, principalmente aqueles que, como Silvio, viam em Constantinopla a última herdeira do antigo Império Romano. A reação de Enea Silvio não se fez esperar: nos anos seguintes ele defendeu energicamente a necessidade de uma cruzada para retomar Constantinopla e Jerusalém dos Turcos, convocando para tal os maiores príncipes e reis de toda a Europa. Dentro de poucos anos sua veemente campanha, unida à grande capacidade diplomática, lhe valeu a eleição ao papado.

Pio II chega a Ancona para dar início a cruzada
Pio II chega a Ancona para dar início a cruzada; detalhe do célebre afresco de Pinturicchio realizado na Biblioteca Piccolomini, dentro da Catedral de Siena. Foto: Wikipédia (domínio público).

Tendo então se tornado papa, Enea Silvio adotou para si mesmo, como pontífice, o nome simbólico de Pio II. Era uma singela homenagem a seu pai e ao amor pelos clássicos que ele tinha lhe transmitido: aquele mesmo herói protagonista da Eneida, Enea Silvio, do qual ele tinha recebido o nome de batismo, era definido por Virgílio várias vezes na sua obra pius Æneas – e assim, eleito papa, Enea Silvio decidiu dar-se o nome de Pio II. Mas o novo papa tinha em mente ainda outra homenagem às suas remotas origens; uma homenagem grandiosa e imponente, digna dos prestigiosos nomes que ele carregava.

Miniatura decorativa de um manuscrito do livro “História de dois amantes” além de diplomata e papa.
Pio II chega a Ancona para dar início a cruzada; detalhe do célebre afresco de Pinturicchio realizado na Biblioteca Piccolomini, dentro da Catedral de Siena. Foto: Wikipédia (domínio público).

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Pienza: a utopia de Pio II

Convocado um dos maiores arquitetos da época, Rossellino, Pio II expôs seu ousado projeto: construir uma cidade ideal, perfeita segundo os paradigmas do Renascimento, uma espécie de utopia arquitetônica em que se realizassem todos os ideais de beleza e harmonia da época. O lugar onde realizá-la? Nada mais nada menos que Corsignano, a pequena cidade natal do papa! Nos anos seguintes, o arquiteto Rossellino demoliu os edifícios da cidade com a intenção de reconstrui-la do zero: Corsignano mudou então de nome, passando a se chamar Pienza, a “cidade de Pio”.

Prédio Piccolomini de Pienza, no estilo renascimental que Rossellino herdou do seu grande mestre Leon Battista Alberti.
Prédio Piccolomini de Pienza, no estilo renascimental que Rossellino herdou do seu grande mestre Leon Battista Alberti. Foto: Laszlo Konya / 123RF.

O resultado é uma das maiores pérolas da arquitetura da Renascença, um sonho de beleza rara e irrepetível. Em pouco mais de três anos o antigo burgo tinha cedido lugar a um centro completamente renovado, cujo coração era a Praça Pio II, para o qual os principais monumentos da cidade, civis e sagrados, tinham vista. Um conjunto arquitetônico sem igual que valeu ao centro histórico de Pienza a declaração de Patrimônio da Humanidade pela Unesco enquanto “obra prima do gênio criativo humano” (1996).

Piazza Pio II, coração da cidade, construída segundo os paradigmas de harmonia e perfeição do Renascimento: permanece até hoje intacta, qual Pio II e Rossellino a conceberam.
Piazza Pio II, coração da cidade, construída segundo os paradigmas de harmonia e perfeição do Renascimento: permanece até hoje intacta, qual Pio II e Rossellino a conceberam. Foto: Lianem / 123RF.

Infelizmente nem Pio II nem seu fiel arquiteto puderam aproveitar por muito tempo o próprio sonho que se tornava realidade: apenas dois anos após a inauguração ambos morriam, a poucos meses de distância. Pio II faleceu no porto de Ancona onde, embora gravemente adoecido, estava prestes a embarcar naquela cruzada aventurosa rumo a Constantinopla que tanto tinha querido. Deixa pensativo imaginar o que a cidade poderia ter se tornado se o projeto não tivesse sido interrompido devido à morte de seus criadores… Reconforta porém saber que seu núcleo principal, a Praça Pio II e arredores, chegou até nós completamente intacto: um espetáculo extraordinário e único de beleza que vale a pena contemplar.

Rua de Pienza - Toscana.
Rua de Pienza – Toscana. Foto Kesu01 / Bigstock

Foto de capa: ZoomTeam / Bigstock

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