“Enquanto estiver em pé o Coliseu, estará também em pé Roma”: assim sentenciava o filósofo Beda na Idade Média, quando a época de grande esplendor de Roma não era mais que uma lembrança. Mas se o decurso do tempo fez ruir o Império Romano, não derrubou, todavia, o Coliseu, que se ergue ainda hoje como testemunha para nós dos tempos passados de glória de Roma. Conheça melhor a longa e conturbada história do monumento símbolo da Itália em todo o mundo.
O símbolo de uma nova era
Após a morte do extravagante imperador Nero, que não havia deixado um herdeiro claro ao poder, o Império caiu em guerra civil. Após um ano de lutas e até mesmo três imperadores assassinados, finalmente Flávio Vespasiano conseguiu prevalecer e se tornar único imperador. Abria-se um período de paz e prosperidade em Roma, que Vespasiano quis simbolizar construindo um edifício suntuoso e destinado a toda a população: o maior anfiteatro que o mundo tinha visto até então.
O conceito de anfiteatro romano é muito parecido com o das nossas arenas e estádios esportivos: um edifício oval com amplas arquibancadas, capaz de acolher um grande número de pessoas, que vinham assistir a jogos e espetáculos. O Anfiteatro Flávio (conhecido hoje como Coliseu), assim chamado justamente em homenagem ao imperador Flávio Vespasiano, tinha as arquibancadas inteiramente em mármore e conseguia abrigar até 75.000 visitantes – dez mil a mais que o Estádio do Morumbi em São Paulo!
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Os espetáculos e a arena
Mas o tipo de espetáculo a que os Romanos assistiam no Coliseu é muito diferente daqueles aos quais nós estamos habituados nos nossos estádios. Na parte da manhã, assistia-se às lutas de animais selvagens e exóticos, trazidos das partes mais remotas do Império: leões, tigres, leopardos, rinocerontes, elefantes e ursos eram atiçados a lutar ou uns contra os outros ou contra um lutador especializado, chamado bestiário. Os animais eram içados do subsolo até a arena por meio de sofisticados elevadores com contrapeso; outros engenhosos mecanismos eram usados para mudar a cenografia da arena ou produzir “efeitos especiais”, tornando a caça aos animais selvagens mais realística e espetacular.
Na pausa do almoço, que separava os espetáculos da manhã daqueles da tarde, ocorria a parte mais bruta da programação: os criminosos condenados à morte eram executados com requintes de crueldade na arena. Alguns eram lançados sem armas à luta contra animais ferozes, outros eram pregados à cruz em meio a animais famintos, para serem devorados. Geralmente o Imperador e as classes mais elevadas da sociedade abstinham-se de tanta violência e aproveitavam a pausa para sair do Anfiteatro e almoçar. Boa faixa da população, todavia, deleitava-se com a ferocidade: assim, ainda que muitos imperadores desaprovassem essa parte da programação, todavia não a aboliram, por temor de desagradar ao povo.
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O show dos gladiadores
Enfim, no período da tarde, ocorriam as exibições pelas quais o Coliseu é mais famoso: o combate dos gladiadores. Ao contrário do que normalmente se pensa, os gladiadores eram quase sempre lutadores profissionais, adestrados durante anos em escolas especializadas, e que lutavam em modo bastante esportivo: era extremamente raro que um gladiador perdesse a vida durante um combate. A luta dos gladiadores era muito amada pelos romanos e contava com inúmeros fãs dentre a população. Havia até mesmo torcidas organizadas, cuja competitividade às vezes degenerava em episódios de violência e até mesmo homicídio: não muito diferente, portanto, do que ainda ocorre em alguns de nossos estádios modernos.
Infelizmente o imperador Vespasiano morreu um ano antes do término das obras e não pôde ver o edifício que patrocinou completado. Coube a seu filho e sucessor, o imperador Tito, inaugurar o Anfiteatro do pai, decretando 100 dias seguidos de jogos e celebração. Estima-se que então mais de 9 mil animais selvagens tenham sido trazidos à arena e, segundo algumas fontes, foi simulada até mesmo uma batalha naval dentro do Coliseu alagando-o artificialmente para a ocasião!
O símbolo de Roma
Após a proibição das lutas dos gladiadores por parte dos imperadores cristãos, o edifício do Coliseu foi gradualmente posto de lado e esquecido pela população. Durante a Idade Média era uma construção completamente abandonada, embora majestosa em meio às humildes casas medievais. Ao longo dos séculos, muitos blocos de pedra foram retirados do Coliseu abandonado e utilizados como material de construção para outros edifícios de Roma: a própria Basílica de São Pedro, no Vaticano, fez uso de blocos “roubados” ao Coliseu.
No entanto, apesar dos muitos danos sofridos, a grandiosidade e imponência do Coliseu conseguiram resistir a seus dois mil anos de história e, ainda hoje, deixam estarrecidos aqueles que tentam abraçá-lo com seu olhar. Tinha razão o sábio medieval: ainda está em pé o Coliseu, ainda Roma está em pé.
Foto de capa: Roman Sigaev / 123RF